sabato
venerdì
:: O ar que respiras...

Saco
de as nuvens que te poisam nos cabelos,
Saco de as aves que te levam o olhar.
Saco de os sonhos
mais pesados do que as pedras.
Porque eu cheguei e é tempo de me veres,
Mesmo que os meus gestos te trespassem
De solidão e tu caias em poeira,
Mesmo que a minha voz queime o ar que respiras
E os teus olhos nunca mais possam olhar.
Sophia de Mello Breyner Andresen
giovedì
:: Leio o Amor...

da tua pele;
demoro-me em cada
sílaba, no sulco macio
das vogais, num breve obstáculo
de consoantes,
em que os meus dedos penetram,
até chegarem
ao fundo dos sentidos.
Desfolho
as páginas que o teu desejo me abre,
ouvindo o murmúrio de um roçar
de palavras que se juntam,
como corpos, no abraço de cada frase.
E chego ao fim
para voltar ao princípio, decorando
o que já sei, e é sempre novo
quando o leio na tua pele.
Nuno Júdice
:: Alguém..

se estava prevista
na palma da minha mão
esta paixão inesperadas
e estava já escrita e demarcada
na linha da minha vida
se fazia já parte da estrada
e tinha que ser vivida
ou foi um desgoverno repentino
que surpreendeu os deuses,
todos os que desenham
o nosso destino
ou foi um desatino, uma loucura
uma imprevisível subversão
que só a partir de agora
eu trago
marcada na palma da minha mão
Bruna Lombardi
:: Amantes...


Os amantes se amam cruelmente
e com se amarem tanto não se vêem.
Um se beija no outro, refletido
.Dois amantes que são?
Dois inimigos.
Amantes são meninos estragados
pelo mimo de amar:
e não percebem quanto se pulverizam
no enlaçar-se,e como o que era mundo
volve a nada.
Nada, ninguém.
Amor, puro fantasma
que os passeia de leve, assim a cobras
e imprime na lembrança de seu trilho.
E eles quedam mordidos para sempre.
Deixaram de existir mas o existido
continua a doer eternamente.
Carlos Drummond de Andrade
:: Amor...

Amor é privilégio de maduros
estendidos na mais estreita cama,
que se torna a mais larga e mais relvosa,
roçando, em cada poro, o céu do corpo.
É isto, amor: o ganho não previsto,
o prêmio subterrâneo e coruscante,
leitura de relâmpago cifrado,que,
decifrado, nada mais existe
valendo a pena e o preço do terrestre,
salvo o minuto de ouro no relógio
minúsculo, vibrando no crepúsculo.
Amor é o que se aprende no limite,
depois de se arquivar toda a ciência
herdada, ouvida.
Amor começa tarde.
Carlos Drummond de Andrade
:: Saber...

o que de ti afastas,
quando a noite implausível
te chama e te reduz.
É só ousares, de ti,
a pálida renúncia, a súbita agonia
em que afogas
o esplendor do dia,
o outro lado do querer,
estar, sentir ou adiar.
Não: nem olhar no vento,
perdido ou encerrado,
nem o esboço de um dedo
que se encaminha para ti.
Nem dor de amar,
nem vergonha de pedir
o que sem sequer pedires
te é dado, ou, antes,
o que de ti for procurado
na curva que antecede
o teu primeiro não.
António Mega Ferreira
mercoledì
:: Quando...

diz "aqui"
que mão acaricia onde?
O eu está inteiro
dentro de "nós"?
Acaricias o meu pulso
com palavras
que saem do coração da mão,
em cada poro dizem
"aqui"pois é esta
a linguagem do amor.
As suas letras voam
para a nossa voz
que sobe da cintura
até ao ombro
do teu corpo
feito das palavras
com que encontro (na mão)
o coração.
Rosa Alice Branco
:: Nos teus olhos...

Um anjo erra
nos teus olhos diurnos
humedecido do véu
(ao fundo, a íris entardece)
seguiu de cor a revoada das pombas
místico um arroubo ascende a prumo
do plano em que me fitas
cisnes desaguam
do teu olhar em fio
e vogam ao redor, pelo estuário da sala
ao sol-poente os vitrais das janelas
ardem na catedral assim erguida
colocamos um sonho
em cada nicho e no círculo formado
pelas nossas bocas
subentende-se com verve a língua.
Sebastião Alba
martedì
lunedì
:: Canção...




muros frios, praia rasa.
Andar, andar que um poeta
Andar, andar que um poeta
não necessita de casa.
Acaba-se a última porta.
Acaba-se a última porta.
O resto é o chão do abandono.
Um poeta, na noite morta,
Um poeta, na noite morta,
não necessita de sono.
Andar...
Andar...
Perder o seu passo
na noite, também perdida.
Um poeta, à mercê do espaço,
Um poeta, à mercê do espaço,
nem necessita de vida.
Andar...
Andar...
- enquanto consente
Deus que seja a noite andada.
Porque o poeta, indiferente,
Porque o poeta, indiferente,
andar por andar
- somente.
Não necessita de nada.
Cecilia Meirelles
:: Nick Kosciuk...
(48X36).jpg)
.jpg)

.jpg)
feito de longe e de leve,
para que venhas comigo
e eu para sempre te leve...
- mas só esse eu não farei.
Uma palavra caída
das montanhas dos instantes
desmancha todos os mares
e une as terras mais distantes...
- palavra que não direi.
Para que tu me adivinhes,
entre os ventos taciturnos,
apago meus pensamentos,
ponho vestidos nocturnos,
- que amargamente inventei.
E, enquanto não me descobres,
os mundos vão navegando
nos ares certos do tempo,
ate' não se sabe quando...
- e um dia me acabarei.
entre o planeta e o Sem-Fim,
a asa de uma borboleta.
Iscriviti a:
Post (Atom)